segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Reencontrando as origens

Por: Saulo Assis
Desenho numa das paredes do CTN / Foto: Saulo Assis

Em meio ao “barulho e a desordem” de São Paulo, um lugar organizado para receber nordestinos que há muito estão longe de casa 

Logo na entrada não é difícil perceber pelo figurino e profusão de acessórios que compõem o ambiente, que se trata, sem deixar o mínimo de dúvidas, de um pedaço do Nordeste em São Paulo. 

O fluxo de pessoas é intenso; umas procurando se aproximar o máximo que podem do palco, onde uma banda esbanja alegria e entusiasmo ao som de um forró pé de serra; outras se acomodam perto de barracas típicas abarrotadas de gente para provarem pratos da culinária de seus Estados; já para outros visitantes, basta o fato de se sentar em algum canto, para daí observar, e, desse modo, entrar de maneira profunda em contato com sua cultura de berço. 

Esse é o CTN (Centro de Tradições Nordestinas), um espaço idealizado na Zona Oeste da capital paulista, que há mais de 20 anos facilita o reencontro de dezenas de milhares de nordestinos às suas origens. Cerca de 16 mil pessoas circulam pelo Centro durante os fins de semana, que costuma ser cheio de atrações, incluindo danças, música, produção artística, e comida, tudo feito com a cara do Nordeste. 

O fundador e presidente do CTN, o paulistano José de Abreu, conta que, ao voltar de uma viagem de férias ao litoral do Nordeste, percebeu que não havia na capital paulista um local onde o migrante nordestino pudesse buscar como referência. A partir disso, imaginou um espaço de reunião comum, uma espécie de “grande família”, com a diferença de que, se tratando desta família, o número de agregados seria muito maior do que costuma ser em lares convencionais. 

O artista Orlando Lopomo, filho de pai italiano e mãe pernambucana, trabalha no CTN há quase dois anos. Começou com uma pequena loja de artesanato no andar superior do edifício. Se viu obrigado a expandir o seu negócio, à medida que o movimento e a demanda por suas obras foram crescendo. Abriu uma segunda loja a fim de suprir a procura e pensa num eventual terceiro ateliê se as vendas continuarem como estão. 

Lopomo faz escultura em madeira, barro e pedra. Dentre a maioria de suas produções, se destacam figuras emblemáticas do folclore e sertão nordestinos, além de carrancas e máscaras tribais africanas, como cangaceiros, caboclos, animais e representações espirituais. 

Por ter a cultura africana como principal referência em sua formação, Lopomo diz que o elemento nordestino contribuiu, significativamente, na evolução do seu trabalho: “África e Nordeste são dois universos complementares e muito próximos cultural e historicamente; então, quando produzo, os dois lados se conversam e se desenvolvem juntos, por serem similares”, explica o artista, com entusiasmo. 

Para a cearense Maria dos Reis, 68, que mora em São Paulo há 40 anos, o Centro representa uma oportunidade única de dar continuidade a suas tradições religiosas da mesma maneira como praticava quando ainda era criança, em sua terra natal, ao lado de seus pais. No dia em que foi visitar o CTN, estava acontecendo, em conjunto à festa popular e profana, um encontro ecumênico religioso promovido pela Igreja Católica, que celebrava a padroeira do Brasil, Nossa Senhora Aparecida. 

Ao lado da senhora Maria dos Reis, está Maria das Graças, 38, uma outra “Maria”, que assiste ao espetáculo da procissão de Nossa Senhora Aparecida, de muito bom humor, em companhia do marido, Aldo Silveira, 40, que é religioso, nordestino, e sempre acompanha a mulher ao CTN, para, segundo ele, “ matar a saudade de casa”. 

Maria das Graças mora há 20 anos em São Paulo e fica emocionada ao se lembrar de quantos anos já se passaram, desde que saiu de João Pessoa, na Paraíba. “Lá eu era muito feliz, mas fui crescendo, sem nunca deixar de estudar e sonhar com um futuro diferente; chegou a hora em que percebi que precisava realizar uma mudança em minha vida e buscar algo grande”, esclarece ela, que vai com frequência ao CTN. 

A supervisora de projetos, Fernanda Alves, 27, está à frente da coordenação de eventos no CTN há pouco mais de três anos e diz ficar bastante contente com o resultado das ações desenvolvidas pelo Centro e a resposta positiva do nordestino que vive em São Paulo. 

“Sendo paulistana, mas filha de pernambucano, me vejo com uma responsabilidade muito importante na mão, em não somente agradar ao público que vem ao CTN, mas em reproduzir aqui dentro, com fidelidade satisfatória, o que se produz originalmente lá no Nordeste, sem deixar de contemplar cada Estado e suas peculiaridades”, encerra Fernanda.

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